Buenas, de volta ao sítio, ainda meio mareada!
Bem bom voltar! Tenho um gavetão cheio de tomates lindos e madurinhos para dar início a produção de molhos para 2012. Tenho apenas um vidro na despensa que veio da produção do verão passado! Exato o tempo entre uma produção e outra. Delícia!
Contudo, não é sobre isso que escreverei hoje. Estive uns dias sumida, pois saímos de férias por 05 dias. Fomos para o inegável paraíso de Fernando de Noronha. Escreverei mais uma vez sobre ambivalência. A ambivalência que senti ao adentrar no arquipélago.
Foto que tiramos ainda no avião
Ficamos 05 dias na ilha e voltei com muitas perguntas. O arquipélago é composto por 21 ilhas, sendo apenas uma habitada. A ilha é um lindo paraíso ecológico onde a maior parte de sua área territorial é mantida como reserva. A área de águas é um espetáculo! Tivemos a oportunidade de mergulhar com tartarugas, peixes, polvos, lagostas, arraias, até mesmo tubarões. Sim, tubarões! É bem bacana chegar perto desses animais. Porém, de certa forma, me senti um pouco intrusa. Algo como “um peixe fora d'água” ao contrário.
Legítimo peixe fora d'água ao contrário!
Fernando de Noronha desperta alguns sentimentos. O povo, pelo que conheci, é muito querido e hospitaleiro, tive gratas surpresas. As praias são um desbunde de tão lindas, a diversidade terrestre e marinha são impressionantes. Sentimentos de alegria, deslumbramento e dúvidas. Sim, lá vem as danadas das perguntas...
Olha a cara de quem tinha muitas perguntas...
A impressão que fiquei é de que a ilha é um ambiente sustentável para quase todas as espécies que vivem lá. É lindo de ver a possibilidade da flora e da fauna se desenvolverem. Ver um número enorme de tartarugas, mabuyas, pássaros, peixes - e muito mais - crescendo e vivendo por lá.
Uma das mabuyas que moravam no nosso quarto.
E porque digo que é sustentável para
quase todas as espécies?
Não é sustentável para a espécie humana!
Alguns dados:
- A energia elétrica da ilha é toda fornecida por geradores à diesel. O diesel vem todo de Recife.
- A água potável para consumo geral é derivada em pequena parte de um açude e em grande parte de uma usina de dessalinização. Nós fomos visitar a usina e o processo é muito legal. Porém, o custo da água é subsidiado. E detalhe, a usina é movida a energia elétrica que, por sua vez, é dependente do diesel externo.
Usina de dessalinização
- Pelo que nos disseram, água para beber para os moradores vem de uma fonte de água potável que é distribuída através de fichas. A água para beber dos turistas vem engarrafada, em sua grande maioria em pequenas garrafas de 500ml da empresa Indaiá da Paraíba.
A primeira garrafa que compramos tinha 1,5lts.
Depois conseguimos uma de 10lts que usávamos para abastecer nossas garrafinhas de inox.
- Os alimentos vem de balsa de Recife (antes de Recife não sabemos). Alimento local somente alguns tipos de peixe e água-de-coco. Isso mesmo!
- Compramos peras argentinas no supermercado (única fruta que tinha no dia, pois a feira ainda não tinha vindo de Recife, levou mais dois dias para chegar). Depois descobrimos uma mangueira carregada na casa do vizinho, com várias mangas no chão. Como esta árvore, haviam muitas outras por lá (e cajueiros também). Porém, não havia manga a disposição nem para venda. Nos fizemos de loucos e pegamos as mangas que estavam nos galhos que caiam para o nosso terreno. O Deva comia umas 05 por dia e trouxe uns 07 caroços para plantar.
Mangas do vizinho
- O Tubalhau, prato típico local (filés de tubarão salgados), já não é mais pescado nem salgado por lá. Também vem de Recife.
Tubalhau, batata inglesa, cebola, azeitona... tudo de fora. Mas estava uma delícia!
- O que vimos foram muitos pacotes, potinhos, garrafinhas, latas, bandejas nos supermercados e locais que forneciam café da manhã. E nos cardápios dos restaurantes camarão, salmão e picanha. Nos contaram de um passeio de barco que oferecia até mesmo churrasco a bordo com direito a pão com alho e picanha.
- Com este modelo de consumo, obviamente há uma grande geração de resíduos. Fomos visitar a usina de resíduos. Coloco alguns dados que nos deram: 20% do resíduo gerado é orgânico (o maior volume é de casca de coco), este resíduo é todo compostado e fica na ilha sendo usado pela aeronáutica. O restante dos resíduos sofrem uma separação, o que pode ser reciclado já é separado e prensado na ilha mesmo. Este resíduo vai todo para Recife e é vendido. Há uma parte do resíduo que não é nem reciclado, nem compostado, também vai para Recife para um aterro sanitário.
Foto aérea da usina de resíduos - tiramos na chegada sem saber o que era. Esse monte de pontos brancos são os sacos que sairão da ilha.
Resíduos
- O principal meio de transporte é o Bugue. Impressionante a quantidade de Bugues que vimos por lá, inclusive alugamos um para um dia. Não há quase bicicletas, vi apenas umas 03 durante os 05 dias. O Bugue é movido a gasolina e a gasolina vem de Recife.
- Não conseguimos visitar a estação de tratamento de esgotos da ilha, mas, pelo que nos disseram, todo o esgoto da ilha é tratado. Vendo a vida marinha do mar no entorno, deve ser isso mesmo. Até porque a população mora em uma área concentrada. A maior parte da ilha é de reserva (70%). Porém, as águas negras e cinzas não são separadas para tratamento e não sabemos como o tratamento é feito nem seus custos. A água que sai ao final do tratamento não é reutilizada e também não sabemos qual o seu destino. Desta forma, não é um ciclo fechado, mais uma vez um modelo linear.
Essas informações podem parecer impressionantes, não é mesmo?! Mas não são um privilégio de Fernando de Noronha. É um modelo bem parecido com o que vivemos nas nossas cidades. Sendo que o tratamento de esgoto e reciclagem de lixo são muito melhores do que a maioria das cidades brasileiras. O que impacta ao ver este modelo em Fernando de Noronha é o fato de ser uma ilha e de ter uma dependência enorme de uma região externa. Se o transporte marítimo colapsasse seria bem complicado.
Do meu ponto de vista, Fernando de Noronha é um paraíso ecológico como poucos! Mas não é um paraíso sustentável para o modelo de vida humano. Com isso faço algumas perguntas: será que o paraíso não é sustentável ou o modelo é que não funciona? Por que é sustentável para as demais espécies?
Ampliando ainda mais a reflexão, façamos o seguinte exercício: a Terra em si é uma ilha, certo? Sendo a Terra uma ilha, podemos usar Fernando de Noronha como um micro exemplo do que é a Terra, ok? Sendo, inclusive, um micro modelo bem otimista (imagine se estivesse usando uma grande metrópole como exemplo). Repare que o modelo de vida do ser humano apresenta-se insustentável nesta ilha, dependendo incessantemente de Recife. Se ampliarmos isso para a Terra, onde está nossa grande Recife? Onde buscaremos os alimentos e combustível fóssil para abastecer este modelo? Pelo que vi por lá, a única espécie que não consegue sobreviver com os recursos disponíveis na ilha é a humana. Desta forma, a última pergunta que sugiro: qual espécie está correndo mais risco com este nosso modelo extrativista/linear de consumo/descarte?
Como falei, voltei de lá com muitas perguntas e sentimentos bem ambivalentes... estranho, quando mais nova eu quis viajar o mundo. Hoje está ficando sem sentido... esvaziando e o voltar para casa uma delícia!
Mas confesso, ficou foi um pequeno desejo de visitar outras ilhas... Cuba, Japão... Quem sabe um dia. Ver pequenas frações em formas de ilhas que representam de forma tão palpável a realidade desta grande nave Mãe. Este olhar sobre uma área menor coloca em uma perspectiva mais mensurável a realidade do nosso modelo. Elucida! Educa!
Mas falando em nave Mãe, dela vieram os tomates que citei lá em cima e é na companhia deles que passarei meu fim de semana. Depois colocarei os resultados aqui.
Tiramos umas 400 fotos da viagem. É tudo tão lindo! Compartilho mais algumas:
Lindezas da vida!
Olha as cores! Amei!
Mangue. Proibido entrar!
Sacadinha do nosso quarto - convite ao descanso!
Continue lendo >>